Personagens de Ouro Preto - 4 - A vizinha da falazada




Vizinhança é sempre algo complicado, pois,  a não ser que você more em uma ilha deserta, ou em um condomínio super luxuoso  com vários metros de propriedade, você terá que lidar com esse problema social que, muitas vezes, destrói amizades, sanidades e propriedades.

Em um local místico da cidade, onde a neblina mora, existe uma vizinha conhecida até por não vizinhos, pois sua voz é audível há quilômetros (permitam-me o recurso hiperbólico, novamente). Os que mais sofriam, obviamente, eram os vizinhos mais próximos. A metralhadora de palavras incompreensíveis disparava logo pela manhã, bem manhã, lá pelas seis. Alguma coisa acionava o gatilho e a mulher começava a falar com aquela voz grave, palavra em cima de palavra, em uma altura que incomodava até mesmo os passageiros dos ônibus que passavam pela rua. Os assuntos, só Deus sabia, apenas era possível compreender algumas poucas expressões, como "conta de luz", "cadeia", "cu", "fedaputa", "traficante" e outras de nível parecido. Se fosse apenas a voz escandalosa, não estaria bem coisa nenhuma, mas além disso, o povo da casa tinha uma caixa de som que colocava no quintal, no último volume, o dia todo. Além desse além, o repertório ia de música gospel, pulando imediatamente para os funks mais rastejantes, como aquele que imita a música de Alceu Valença: "Morena tropicana, eu vou falar pra tu, eu quero cu". O que fazer com uma vizinha dessa, que polícia não é ameaça e amor e respeito ao próximo não são noções conhecidas? Se é um maluco com uma arma, eu juro que seria possível, num momento de insanidade madrugal, acertar um tiro nas fuças dela, mas se é um cidadão normal, a solução é se mudar e torcer para que o próximo nativo, ao menos, tenha um gosto musical melhor.

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