Sobre o sentido da vida

 
Eu nunca acreditei em santos, nunca beijei imagens, ou gostei dos sermões dominicais. Ia à igreja porque não me era permitido ir a outros lugares, e lá, eu e minha irmã ríamos sem controle de quando a vó depositava cédulas do século passado no cestinho de oferendas, ou quando ela queimava cabelo de pobres penitentes nas procissões. Porém, eu já tive medo do diabo, embora nunca tivesse acreditado em sua existência (vai que existisse). Adão, Eva, paraíso, céu, inferno, nunca fizeram parte de minhas convicções. Até hoje não entendo como historinhas infantis podem ser verdades absolutas, mas aceito que pessoas precisem, queiram ou não reflitam sobre tais histórias. Sem crenças e totalmente contraditória, fui crescendo, em meio ao misticismo incrédulo, crendo em sentimentos e realidades inacreditáveis. 

Até que criei ou absorvi uma crença, a de que Deus seja um ser incognoscível, nunca dentro das representações simplórias que conhecemos. Tudo o que conhecemos, e o que não conhecemos, o que não entendemos e que os nossos sentidos não são capazes de perceber, para mim, são Deus. Eu sou parte desse Deus e parte de tudo, que seria uma espécie de organismo. Um corpo, simploriamente imaginando o segredo de tudo. Eu e todo o resto fazemos parte de uma coisa só, somos Deus também. 

Qual o sentido de uma vida? Apenas o de ser, estar e reproduzir? Qual o sentido da reprodução? Apenas existir? Qual o sentido de existir? Paradoxo infindável. Quando nos igualamos a todas as outras espécies vivas, e quando nos julgamos superiores, nenhuma resposta é satisfatória. Qual é o sentido de toda essa organização que nós, seres humanos, fizemos neste planeta? O sentido de termos horários, tarefas, coisas, relações? Qual o sentido de se ser feliz, ou triste?

Quase tudo o que nos faz felizes, assim o faz através de nossos sentidos, através de nossos corpos, de nossa materialidade. O prazer de um toque, um beijo, um abraço, o prazer do sexo, do gosto, da beleza, o prazer de um perfume, de um sol batendo numa manhã gelada, o prazer de um cobertor no sofá, de um aconchego, de todas as percepções de um lugar novo, tudo é possível porque temos nossos corpos. Quando morrermos, esse corpo se acabará e se transformará. Qual o sentido? Se nos transformarmos em espíritos, sem nossos corpos e sem os prazeres mundanos, o que restará? Qual seria o sentido da pós vida? Se tudo o que temos, somos e sabemos se acaba, é ceifado de nós, até nós mesmos somos retirados de nós. Se deixarmos de existir, qual será o sentido de todo o sentimento que tivemos, temos e queremos ter?

Qual o sentido de sofrer por coisas que não temos, relacionamentos que não dão certo, por situações que nos atormentam, por coisas que nós mesmos escolhemos? Qual o sentido de continuar vivendo como máquinas, qual o sentido de absorvermos conhecimento, o sentido de guardarmos memórias, o sentido de fazermos coisas boas? Qual o sentido de não querer e não permitir o sofrimento alheio, se ele pertence a todos? Qual o sentido de se lutar tanto por algo que se acaba?

Se existe a reencarnação, baseada em evolução pessoal, qual o sentido dos laços, das relações? Tudo o que somos, o que queremos e o que sentimos, é construido através das pessoas que conhecemos desde nosso nascimento. Qual o sentido de sempre renovarmos tudo isso e nunca mais termos as mesmas relações? Qual o sentido da evolução espiritual, por que o cosmos precisa de seres evoluídos, quais suas funções? 

Nada faz sentido.  

Se alguém conhece o sentido, indique-me o caminho para esse conhecimento.

Comentários

  1. Nada faz sentido. Esse é o significado da pobreza fundamental do homem. Não sabemos de onde viemos nem para onde vamos. No caminho um por quê e as dúvidas sem respostas. Me parece que a verdade não é pasta esse plano.

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